1 Estado
Segundo Aristóteles, o homem é um
animal político, do que se segue que a convivência em sociedade é resultado da
natureza do homem. Entretanto, filósofos dos séculos XVII e XVIII se
preocuparam em apresentar outro tipo de explicação racional para o surgimento
da vida em sociedade e, consequentemente, para a criação do Estado. Tais
filósofos são conhecidos como contratualistas,
pois defendem que os homens por natureza são livres e iguais, mas em algum
momento surgiu a necessidade de abrir mão desses direitos e estabelecer um
pacto, um contrato social. Vejamos
isto a seguir.
1.1 Teorias
Contratualistas
Essas teorias recorrem a uma situação
hipotética e retórica conhecida como Estado
de Natureza. A forma como os homens se encontravam organizados e se
relacionavam no Estado de Natureza é que vai justificar o modo apropriado de
organização e natureza do Estado. Vejamos.
Thomas
Hobbes, autor da
célebre obra O Leviatã, não
concordava com Aristóteles quando este afirmava que o homem possui em sua natureza
o instinto de sociabilidade. O que ocorre é que os homens são competitivos
entre si, onde sempre encaram o outro como um concorrente que precisa ser
dominado para o alcance de seus interesses e a satisfação dos seus desejos. Daí
surge como consequência que do estado de
natureza se seguiu um estado de
guerra de todos contra todos, onde ocorriam matanças e toda sorte de
abusos. Isso levou Hobbes a afirmar que “o homem é o lobo do homem” (homo homini lúpus).
Para resolver o impasse acima,
portanto, foi necessário que os homens delegassem sua liberdade e igualdade
(direitos naturais) para o estado, que regula as relações entre os indivíduos
da sociedade formada. Isso seria o contrato social nos moldes de Hobbes.
Como consequência da delegação da
liberdade e igualdade, os homens não poderiam mais guiar a si mesmos, deixando
esta tarefa para o estado, que governaria a todos, impondo ordem, segurança e
direção à situação catastrófica em que se encontravam os homens. Nas palavras
de Hobbes, os homens deveriam
[...]
conferir toda sua força e poder a um homem, ou a uma assembleia de homens, que
possa reduzir suas diversas vontades, por pluralidade de votos, a uma só
vontade [...] é como cada homem dissesse a cada homem [...] transfiro meu
direito de governar a mim mesmo a este homem, ou a esta assembleia de homens,
com a condição de transferires a ele teu direito, autorizando de maneira
semelhante todas as suas ações.
Desse modo, caberia ao Estado, que é
soberano, assegurar a paz e a defesa comum da sociedade. Isso impediria que os
homens continuassem caçando a si próprios, eliminando a barbárie.
Para
John Locke, filósofo
inglês, os homens, no estado de natureza, não viviam em uma guerra de todos
contra todos, como acreditava Hobbes, mas apresentavam como problema o fato de
cada um ser juiz de si mesmo. Ora, não havia uma normatização geral para
regular a relação dos homens entrei si, do que segue a aparição de vários
problemas. Para resolver esse impasse, surge o estado, que teria como função
primordial garantir a segurança dos indivíduos e de seus direitos naturais,
como a liberdade e a propriedade.
Desse modo, através do contrato
social, nos moldes de Locke, delegariam ao estado o direito de normatizar e
julgar as relações entre os homens. Os direitos a liberdade e a igualdade,
entretanto, não seriam transferidos de forma alguma. Daí surge a concepção de Estado Liberal, que apenas julgaria os
conflitos sociais, sem interferir nos direitos individuais, como a expressão
dos pensamentos, a propriedade e a atividade econômica.
A diferença fundamental entre o estado
soberano de Hobbes e estado liberal de Locke é que, no primeiro, não há
direitos individuais e que, no segundo, tais direitos são assegurados pelo
Estado.
Outro filósofo contratualista, que
apresentou seu próprio ponto de vista, é o francês Jean-Jacques Rosseau. Esse pensador afirma que o homem por natureza
é livre e é a vida em sociedade que o acorrenta, minando sua liberdade.
Contudo, Rosseau afirma que há um único fundamento legítimo para o poder político,
que seria o pacto social.
Para Rosseau, o pacto social consiste
em todos os homens transferirem sua vontade particular à vontade geral. Ou
seja, cada cidadão se submete ao poder político (ao Estado) desde que este
represente a vontade geral do povo. Assim, o dever ou compromisso de cada
cidadão é apenas com seu povo, que é a fonte legítima da soberania do estado.
Assim, nas palavras de Rosseau, “cada um de nós põe sua pessoa e poder sob uma
suprema direção da vontade gera, e recebe ainda cada membro como parte
indivisível do todo”.
O que caracteriza fundamentalmente o
estado nos moldes de Rosseau é que cada cidadão deve obedecer às leis que regem
a sociedade, contudo tais leis devem
representar a vontade geral do povo, o implica que obedecê-las não
contraria a sua própria vontade particular. O interesse último do estado
legítimo é o bem comum. Para Rosseau, um estado que não tenha essa configuração
não é legítimo.
Vale salientar que uma diferença
básica entre Hobbes e Rosseau é que, para o primeiro, o homem é portador de um
instinto natural perverso, necessitando da sociedade para coibi-los, e para o
segundo o homem tem uma natureza boa, que foi corrompida pela vida em
sociedade.
1.2 A divisão dos
poderes políticos
Como o Estado tem a função de regular
o convívio entre os indivíduos, é natural que apareçam três tipos de poderes. O
poder de legislar (legislativo), o poder de julgar de acordo com as leis
(judiciário) e o poder de executar as leis (executivo). Esses poderes,
entretanto, nem sempre foram divididos, o que implicava que um mesmo homem ou
instituição legislava, julgava e executava. Isso abria precedentes para que
houvesse constantemente abusos de poder.
Para combater o exposto acima, o
filósofo francês Charles de Secondat,
mais conhecido como barão de Mostesquieu,
propôs uma teoria da divisão dos três tipos de poderes, pois:
Quando
os poderes legislativo e executivo ficam reunidos numa mesma pessoa ou
instituição do Estado, a liberdade desaparece [...] Não haverá também liberdade
se o poder judiciário se unisse ao executivo, o juiz poderia ter a força de um
opressor. E tudo estaria perdido se uma mesma pessoa ou instituição do Estado
exercesse os três poderes: o de fazer leis, o de ordenar a sua execução e o de
julgar os conflitos entre os cidadãos.
Desse modo, Mostesquieu defendia que
os poderes políticos devem ser separados, independentes e equilibrados entre
si. Os estados modernos (que não são ditaduras) se organizam dessa forma.
1.3 O Estado segundo
Hegel
Pensando diferente de Locke e Rosseau,
Georg Hegel não acredita na ideia de estado liberal e que se pode falar em
indivíduos isolados em estado de natureza, que posteriormente se organizariam
em sociedade. Para Hegel, o indivíduo humano só pode ser visto enquanto tal à
medida que esteja inserido em uma sociedade: o indivíduo é um ser social. Além disso, o filósofo alemão defende
que o estado não é soma de indivíduos, não fundado na vontade geral e nem fruto
de contrato social. Para Hegel, o Estado
precede o indivíduo, sendo, portanto o fundador
da sociedade civil.
Mas de onde vem o Estado? Segundo
Hegel, e de acordo com sua filosofia, que enfatiza o desenvolvimento do
espírito ao longo da história e diz que a realidade é a manifestação da razão
ou espírito, o estado seria a
manifestação do espírito objetivo em seu desenvolvimento, que concilia a
universalidade humana com os interesses particulares. Conforme escreve Hegel
O
Estado é a realidade efetiva da ideia ética [...]. O indivíduo tem, por sua
vez, sua liberdade substancial no sentimento de que ele (o Estado) é sua
própria essência, o fim e o produto de sua atividade [...] por ser o Estado o
espírito objetivo, o indivíduo só tem objetividade, verdade e ética se toma
parte dele.
Desse modo, o Estado possui uma
universalidade que está acima dos interesses pessoais.
1.4 O estado como
instrumento de domínio de classe
Para Karl Marx e Friedrich Engels,
filósofos alemães, entretanto, a sociedade humana vivia de forma primitiva
antes do surgimento do estado. Nessas comunidades não havia classes e as funções administrativas eram exercidas pelo
conjunto de seus membros. Mas em um determinado momento, um grupo se impôs,
pelo uso da força, e passou a privatizar certas funções antes desenvolvidas
pela comunidade. Esse grupo normatizou a organizou a vida coletiva. Disso
surgiu o que se chama de estado.
Esse fenômeno, a aparição do estado,
entretanto, surge quando a produção econômica permite uma divisão das classes em mais abastadas e menos abastadas. Surge
então uma relação entre exploradores
e explorados, onde o papel do estado seria mediar os conflitos
daí surgidos, evitando uma luta entre essas classes antagônicas, por um lado,
mas estando a serviço da classe exploradora, por outro.
Para Marx e Engels, portanto, o estado surge para ser um instrumento de
dominação da classe dominante (exploradora) sobre a classe dominada (explorada). Desse modo, “a história da humanidade é a
história da luta de classes”.
A exploração consiste em que não há
uma universalização do trabalho, que é o fundamento da produção material. A
classe dominada (também chamado de classe proletária) é a única que produz, mas
sua produção acaba indo para abastar a classe dominante.
Na sociedade
capitalista, por exemplo, o papel do estado é assegurar a proteção da
propriedade privada dos que a possuem em detrimento dos interesses dos que nada
têm. Para proteger a propriedade dos capitalistas, o estado tem uma série de
instrumentos que visam preservar as relações sociais, as normas jurídicas e a
manutenção das desigualdades sociais. Assim, para os filósofos alemães, o
estado surge da desigualdade e para perpetuar a desigualdade.
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