1 Política
Os gregos da antiguidade se
organizavam em cidades-estados chamadas “polis”,
o que influenciou na criação de termos como politike,
a política. De uma forma geral, a política passou a designar todos os assuntos
relacionado à polis, que
posteriormente, e em consequência disto, os assuntos relacionados às
sociedades, ao sentido de comunidade e a até mesmo à vida urbana. Partindo
disto, criou-se a Filosofia Política, que investigava (e investiga) todas as
questões referentes ao convívio em sociedade e ao espaço público e político.
Vejamos como essa investigação se
desenvolveu na história da filosofia.
1.1 Platão e
Aristóteles: a política voltada para o bem comum
Na Grécia Antiga, dois filósofos defendiam
que a Política tinha a finalidade de propiciar o bem comum aos habitantes da pólis. Vejamos como se deu isso.
Platão, em seu livro A República, explica que o homem possui
três tipos de alma: a concupiscente,
a irascível e a racional. A primeira está associada aos desejos carnais, a segunda
às paixões e a terceira ao conhecimento. Analogamente, o filosofo grega afirma
que a pólis se divide em três grupos
sociais: os produtores, que são
responsáveis pela produção econômica, que seriam os artesão e agricultores e
criadores de animais, que seria correspondente à alma concupiscente; os guardiães,
que seriam os responsáveis pela defesa da cidade, como os soldados, que
corresponderia a parte irascível da alma;
e os governantes, que seria correspondente
à alma racional.
Desse modo, Platão afirma que uma
sociedade justa seria aquela onde há um equilíbrio entre esses grupos sociais,
onde cada um deveria exercer suas respectivas funções. Veja:
Um
acordo perfeito entre os três elementos da sua alma, assim como entre os três
tons extremos de uma harmonia – o mais agudo, o mais grave, o médio, e os
intermédios, se os houver -, e que, ligando-os uns aos outros se transforme, de
múltiplo que era, em uno, moderado e harmonioso.
Isso expressa muito bem a ideia de
harmonia entre os três grupos que compõem a sociedade.
Além disso, como a alma racional é
alma que está associada ao conhecimento, sendo, portanto, a que governa sobre
as demais, o grupo dos governantes deve estar naturalmente acima dos outros.
Desse modo, Platão propõe uma sociedade onde se separariam os jovens mais aptos
ao conhecimento, através da educação, dos quais, após uma vida inteira de busca
e cultivo do conhecimento, sairia o governante. Esse governante sábio é
conhecido como o Rei Filósofo.
Como, para Platão, quem deve governar,
portanto, deter o poder, é o mais sábio, essa forma de governo é denominada de Sofocracia: o governo dos sábios.
Aristóteles, que firma que “o homem é
por natureza um animal social”, a exemplo de Platão, seu mestre, também
defendia que a Política tinha como finalidade o bem comum, entretanto, com
algumas características peculiares. Veja o que ele afirma em Ética a Nicómaco:
Mas
não terá o seu conhecimento, porventura, grande influência sobre essa vida?
Semelhantes a arqueiros que têm um alvo certo para a sua pontaria, não
alcançaremos mais facilmente aquilo que nos cumpre alcançar? Se assim é,
esforcemo-nos por determinar, ainda que em linhas gerais apenas, o que seja ele
e de qual das ciências ou faculdades constitui o objeto. Ninguém duvidará de
que o seu estudo pertença à arte mais prestigiosa e que mais verdadeiramente se
pode chamar a arte mestra. Ora, a política mostra ser dessa natureza, pois é
ela que determina quais as ciências que devem ser estudadas num Estado, quais
são as que cada cidadão deve aprender, e até que ponto; e vemos que até as
faculdades tidas em maior apreço, como a estratégia, a economia e a retórica,
estão sujeitas a ela. Ora, como a política utiliza as demais ciências e, por
outro lado, legisla sobre o que devemos e o que não devemos fazer, a finalidade
dessa ciência deve abranger as das outras, de modo que essa finalidade será o
bem humano. Com efeito, ainda que tal fim seja o mesmo tanto para o indivíduo
como para o Estado, o deste último parece ser algo maior e mais completo, quer
a atingir, quer a preservar. Embora valha bem a pena atingir esse fim para um
indivíduo só, é mais belo e mais divino alcançá-lo para uma nação ou para as cidades-Estado.
Para alcançar tal finalidade,
entretanto, Aristóteles faz um mapeamento acerca das formas possíveis de
governo. Segundo o estagirita, os governos podem ser divididos em relação a
servir ao bem comum ou ao interesse privado. Além disso, pode ser composto por
um homem só, por poucos homens ou pela maior parte dos homens. Dessa
configuração, classificam-se três tipos de governos corretos e três tipos de
governos corruptos. São eles:
Governos corretos: monarquia, de um
homem só; aristocracia, de poucos homens; e polítia, da maior parte dos homens.
Governos corruptos: tirania, de um
homem só; oligarquia, de poucos homens; e democracia, da maioria dos homens.
Em Aristóteles e em Platão, há uma
relação direta entre a ética e a política.
1.2 Maquiavel: o
príncipe e seu interesse privado
Para Nicolau Maquiavel, observando que
há uma disparidade entre a política ideal e a política real, o objetivo da
política é tão somente conquistar e se
manter no poder. Para alcançar essa finalidade, o príncipe deve agir de
acordo com uma cisão entre a ética e a
política. Veja o que o próprio filósofo afirma:
O quão louvável é que
um príncipe honre a sua palavra e viva de uma forma íntegra, cada qual o
compreenderá. Todavia, a experiência nos faz ver que, nestes nossos tempos, os
príncipes que mais se destacaram pouco se preocuparam em honrar as suas
promessas; que, além disso, eles souberam, com astúcia, ludibriar a opinião
pública; e que, por fim, ainda lograram vantagens sobre aqueles que basearam as
suas condutas na lealdade.
Assim, devemos saber
que existem dois modos de combater: um com as leis; o outro, com a força. O
primeiro modo é o próprio do homem; o segundo, dos animais. Porém, como o
primeiro muitas vezes mostra-se insuficiente, impõe-se um recurso ao segundo.
Por conseguinte, a um príncipe é necessário saber valer-se dos seus atributos
de animal e de homem.
[...] E pois que um
príncipe precisa saber realmente valer-se da sua natureza animal, convém que
tome como modelos a raposa e o leão; posto que a raposa mostre-se indefesa
contra os lobos e o leão contra as armadilhas do homem, o príncipe proverá às
suas carências com aquela conhecendo as armadilhas do homem e com este
espavorindo os lobos. Com efeito aqueles que agem unicamente como leões revelam
a sua inabilidade. Portanto, não pode nem deve um soberano prudente cumprir as
suas promessas quando um tal cumprimento ameaça voltar-se contra ele e quando
se diluem as próprias razões que o levaram a prometer. Se os homens fossem
todos bons, bom não seria o preceito; mas, visto que eles são pérfidos e que,
em teu favor, tampouco honrariam a sua palavra, tu não tens de sertir-te no
dever de, em seu favor, honrar a tua. Aliás, razões jamais faltam a um príncipe
para fundamentar o descumprimento das suas promessas.
[...] A um príncipe,
portanto, não é necessário que de fato possua todas as sobreditas qualidades, é
necessário, porém, e muito, que ele pareça possuí-las. Antes, ouso dizer que,
possuindo-as e praticando-as sempre, elas redundam em prejuízo para si, ao
passo que, simplesmente dando a impressão de possuí-las, as mesmas mostram toda
a sua utilidade. Da mesma forma, tu, conquanto aparentes ser o que és –
piedoso, fiel, humano, íntegro e religioso –, deves estar preparado e apto
para, em caso de necessidade, demudar-te no teu contrário.
[...] Ademais, das
ações de qualquer homem e mormente das ações de um príncipe (nenhum tribunal
sendo competente para julgá-lo) consideramos simplesmente os seus resultados.
Em sendo assim, o príncipe deve fazer por onde alcançar e sustentar o seu
poder: os meios serão sempre julgados honrosos e por todos elogiados, e isto
porque apenas às suas aparências e às suas consequências ater-se-á o vulgo,
este vulgo cuja presença é predominante no mundo.
Bem, Maquiavel propõe que o poder
político está envolto em lutas e tensões entre os grupos sociais, que seriam,
basicamente, os poderosos e o povo. Partindo do pressuposto que a
política sempre foi e sempre será assim, é mera ilusão buscar o bem comum para
todos. Basta alcançar e manter o poder.
Também vale a pena
ressaltar que, para Maquiavel, há dois tipos de virtude: a virtú do tirano e a virtú
do homem político. O Príncipe deveria cometer seus crimes com a virtude do
homem político. Cuidando para aparentar ser virtuoso no sentido convencional
(piedoso, caridoso, etc.) e buscando ser amado e temido. Contudo, quando não
for possível ser amado e temido simultaneamente, é melhor ser temido que amado.
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