1 Epistemologia
Epistemologia ou Teoria do
Conhecimento é o ramo da Filosofia que investiga sobre a problemática do
conhecimento. As questões que interessam ao filósofo nesse campo são do tipo:
“o que é o conhecimento?”; “quais as origens do conhecimento?”; “quais as
possibilidades do conhecimento?” e outras questões congêneres.
1.1 Conhecimento
Na história da filosofia, ficam
evidentes as partes envolvidas no processo do conhecimento, quais sejam: o objeto que é conhecido e o sujeito que o conhece. O objeto do
conhecimento nada mais é do que a realidade e o sujeito do conhecimento somos
nós, seres humanos. Consideremos as linhas a seguir.
Todas as pessoas do mundo julgam saber
alguma coisa, tais como que estão acordadas, que tem dois irmãos, que estão
vivas e que João vende sorvete aos domingos. Algo que nos questionamos,
entretanto, é: como podemos afirmar que sabemos alguma coisa. O que é condição
necessária e suficiente para o conhecimento?
Podemos dizer que conhecimento é uma
crença. Mas se eu digo que Napoleão Bonaparte está na minha casa ninguém
acreditará. Então eu respondo: Mas eu acredito! Entretanto não consigo imaginar
que alguém considere isso verdadeiro simplesmente pelo fato de eu acreditar.
Se, por outro lado, eu digo que não existem baleias no oceano, as pessoas
também não me darão credibilidade, ainda que eu de fato acredite. Ou seja,
parece que a minha crença não torna uma coisa verdadeira nem falsa, o que
significa que é insuficiente para dizer que alguém conhece algo.
Mas podemos dizer que conhecimento é
crença verdadeira. Nesse caso, proponho a pensarmos numa aposta entre Juca e
Antônio. Ambos apostaram entre si cinco palhetas de guitarra, onde, se o
Cruzeiro fosse campeão brasileiro de 2014, Juca ganharia a aposta, caso
contrário Antônio seria o vencedor. Lembrando que a aposta acontece antes mesmo
do campeonato começar. Ao término do campeonato Juca sai vencedor e diz: “Há há
há! Eu sabia!”
Será que de fato Juca sabia disso? Ele
pode dizer que acreditava que o Cruzeiro seria o campeão, tanto que apostou,
mas isso é suficiente para afirmar que ele tinha o conhecimento?
Tudo indica que crença verdadeira não
é condição suficiente para fundar o conhecimento. É necessário algo mais.
Então sugerimos que conhecimento seja
crença justificada. Nesse caso, pensemos agora no irmão gêmeo, e idêntico, de
João que Juca e Antônio não conhecem. É que João mora com a avó, enquanto seu
irmão vive com os pais. Juca e Antônio observam de longe o irmão gêmeo de João
vendendo sorvete no centro da cidade por três domingos seguidos, o que os leva
a acreditar que João vende sorvete aos domingos.
Nesse caso, temos indivíduos que têm
uma crença e tem uma justificativa, pois ver com os próprios olhos consiste
numa boa justificativa. Entretanto a crença é falsa.
A conclusão disso tudo é que o
conhecimento não pode ser meramente crença, nem crença verdadeira, nem crença
justificada. O conhecimento é crença,
que deve ser verdadeira e ter uma justificação. Então, conhecimento é crença verdadeira e justificada.
1.2 Fontes do
conhecimento
Uma das questões fundamentais da
teoria do conhecimento pode ser formulada da seguinte forma: onde se origina o
conhecimento? Ou ainda: qual a fonte de todo o conhecimento.
Na tentativa de responder a estas
questões, diversos filósofos divergiram entre si, mas se tem algo que se pode
dizer com clareza é que todos consideram dois aspectos fundamentais: a razão e a sensação.
Aqueles que afirmam que a razão é a fonte de todo conhecimento
seguro geralmente são guiados pela ideia de que as sensações, os sentidos, por
vezes podem enganar. Por exemplo, poderia argumentar, contra alguém que defende
que a fonte do conhecimento é a sensação, dizendo que vemos (portanto
percebemos) o sol de um determinado tamanho, mas sabemos, porque usamos a
razão, que ele é muito maior do que parece. Não obstante, esse alguém pode
contra-argumentar dizendo que eu sei disso porque, ao observar coisas a
diferentes distâncias, percebo que quanto mais longe elas estão menores
parecem. No fim das contas, a fonte ainda continua sendo a sensação.
Durante muito tempo esse foi um
impasse entre os filósofos, sensação ou razão. Nessas condições, de onde provém
o conhecimento?
1.3 Racionalismo
Racionalismo é a corrente filosófica
que afirma que a razão é a única fonte segura para o conhecimento. O principal
expoente do racionalismo é o filósofo francês René Descartes, o qual defendia
que não se pode aceitar nenhuma proposição ou ideia como verdadeira a
menos que seja clara, distinta, evidente por si mesma.
Para chegar à primeira verdade
indubitável, Descartes usa quatro regras básicas:
A evidência:
não aceitar algo como verdadeiro a menos que se mostre evidente;
A análise:
dividir os problemas em partes simples para uma melhor resolução;
A síntese:
concluir os pensamentos na ordem dos mais simples e fáceis para os mais
complexos e difíceis;
E o desmembramento: enumerar as informações de forma exata e sem
omissões.
Do uso dessas regras, Descartes chega
à sua famosa máxima: “penso, logo existo”, que é conclusão de alguns
argumentos: a falibilidade dos sentidos, o argumento do sonho e o gênio
maligno. Vejamos como ele chegou a essa conclusão.
[...]
Mas eu me persuadi de que nada existia no mundo, que não havia nenhum céu,
nenhuma terra, espíritos alguns, nem corpos alguns; não me persuadi também,
portanto, de que eu não existia? Certamente não, eu existia sem dúvida, se é
que eu me persuadi, ou, apenas, pensei alguma coisa. Mas há algum, não sei qual,
enganador mui poderoso e mui ardiloso que emprega toda a sua indústria em
enganar-me sempre. Não há, pois, dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e,
por mais que me engane, não poderá jamais fazer com que eu nada seja enquanto
eu pensar ser alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisto e ter
examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por
constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira
todas as vezes que a enuncio ou a concebo em meu espírito.
Assim, Descartes consegue chegar à
primeira ideia ou proposição indubitável: “penso, logo existo”.
Concomitantemente, Descartes assume que a ideia
de perfeição, infinitude ou eternidade
só poderiam ser derivadas de um ser que possuísse tais atributos e que, por
isso, fosse bom. Este ser, não
obstante, só pode ser Deus, que,
sendo bom, não poderá nos enganar jamais. Disso se segue que podemos conhecer o
mundo ao nosso redor.
1.4 Empirismo
Corrente filosófica que afirma que o
conhecimento, em última instância, deriva da experiência, seja de forma direta ou indireta. Pode-se dizer que
dois de seus maiores representantes são John
Locke e David Hume.
John Locke defendia que a mente humana
é como uma tabula rasa, na qual são
impressas as experiências, o que implica na não existência de ideias inatas. O filósofo inglês dividia as
ideias em:
Ideias
da sensação: que são
as ideias que chegam a nossa mente através dos sentidos (cor, temperatura, sabor,
etc.);
Ideias
da reflexão: que
resultam de um processo de combinação e associação das sensações através da
atividade da reflexão (perceber, pensar, crer, raciocinar, etc.).
Desse modo, das ideias mais simples, a
mente poderia chegar às mais complexas, sempre tendo como ponto de partida as
coisas materiais externas. No entanto, Locke não era um empirista radical, pois
admitia que o conhecimento matemático não se baseia na experiência, mas em
fundamentos lógicos.
David Hume, por seu turno, também
defendia que o conhecimento se deriva da experiência, que tudo que ocorre em
nossa mente são fruto de percepções. O filósofo escocês dividia as percepções
em:
Impressões: que são os dados fornecidos pelos
sentidos;
Ideias: que são as representações mentais.
Para Hume, as impressões são mais
fortes e claras do que as ideias. Além disso, as ideias são simples, quando
apenas reproduzem as impressões sem alterá-las, e compostas, quando combinam as
ideias simples. Ex: “cavalo alado”, onde se pega a ideia de “cavalo” e de “asa”
e as colocam juntas; e “montanha de ouro”, onde se combinam as ideias simples
de “montanha” e “ouro”. Esse processo responsável pela produção das ideias é
chamado de associação de ideias.
1.5 Criticismo
Criticismo é a corrente filosófica que
defende que nem somente a experiência nem somente a razão podem resolver o
problema das fontes do conhecimento. Seu fundador, Immanuel Kant, dizia que o
conhecimento tem duas fontes: a sensação e o entendimento (razão), onde a primeira recebe os dados dos sentidos
e o segundo os organiza.
Kant ainda assinala que há dois tipos
de conhecimento:
Empírico: que se refere aos dados fornecidos
pelos sentidos, sendo posterior a experiência (diz-se que é um conhecimento a posteriori).
Puro: que não depende dos dados dos
sentidos, sendo anterior a experiência (diz-se que é um conhecimento a priori). Esse tipo de conhecimento
apresenta os juízos universais e necessários.
Quanto aos juízos, o filósofo de Konigsberg os classifica em:
Analíticos: aqueles cujo predicado está contido
no conceito do sujeito. Ex: “o quadrado tem quatro lados”.
Sintéticos: aqueles cujo predicado não está
contido no sujeito. Ex: “os corpos se movimentam”.
Quanto à valoração, os juízos podem ser:
Analítico: quando tem a finalidade de elucidar
algo que já se conhece do sujeito. Ex: “Um triângulo tem três lados”.
Sintético
a posteriori: quando amplia o conhecimento sobre o
sujeito, mas sua validade está condicionada ao tempo e espaço em que se dá a experiência.
Ex: “a capa do livro é azul”.
Sintético
a priori: quando amplia o conhecimento sobre o
sujeito e não está sujeito ao tempo e espaço em que ocorre a experiência. Ex:
“a soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer equivale a 180 graus”. Para
Kant, esse é o tipo de enunciado mais importante para a ciência.
Posto isto, deve-se lembrar de que
Kant inverte a ótica que até então prevalecia, que colocava o objeto no centro do processo do
conhecimento. Kant coloca o sujeito
como centro desse processo, uma vez que as formas a priori do entendimento é que regulavam o conhecimento. Isto ficou
conhecido como a nova revolução
copernicana.
Para Kant, nós
apreendemos os dados dos objetos através da sensibilidade, mas o entendimento
determina as condições pelas quais o objeto é pensado. As formas da
sensibilidade, não obstante, são o tempo e o espaço.
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